terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Até parece à Kg...

Fica esse disse me disse o tempo todo
fulano isso fulano aquilo outro
ninguém me respeita, taco um ovo
fulaninho é bonitinho, mas age como um porco
Parece que espalharam espelhos pela cidade
as ruas já não tem mais aquela tranquilidade
Somos do tempo de tamanha conectividade
enumerada pela geração 3 de conexão
que não pega no celular que me levou o ladrão!

Turbalina, minha querida, traga-me um chá!

Ensaios destalentosos de meu desalento em perceber ser menos poderoso.
Desestimulado, continuo tentando.
Tentar não é conseguir, que fique claro, mas é um desestimulante perfeito pras oras vagas...que são muitas, talvez menos aproveitadas como deveriam, porém vívidas em intensidade sonora (e plástica).
Disfunção digital movida a palmadas nas costas da mão, escrava de um coração menor que um limão e tão ácido quanto.
Sei menos sobre inversão do que deveria, costumo usar isso ao meu favor e escrever sempre de ponta cabeça, ombro, joelho e pé.
Joelho e pé descalso para pisar no solo sagrado da folha em branco.
Exercitar o hálito é preciso, já tinha me esquecido de como se faz desinteressado aquele moço desenganado que só queria um amor para amarrar no pé de sua individualidade que cresce sem vontade de retroceder.
Rufem os tambores, o sinal fechou, preparem-se para a orda de solitários que vai parar para outra multidão de tristonhos bípedes sofrerem mais um pouquinho sob Sol forte.
Desconfigurando as formas de se avaliar um corpo estranho, faço desse texto um emblema, afixado corretamente no peito, desfruta da aprovação dos olhares certos.
Nisso as formigas se preparam para atacar o açucareiro. Eis que a mosca chega antes e...
Nada mais natural que escrever quando se quer escrever. Criar pra quê se eu ainda não sei o que vai ser? Poetisar desanimou o dia. Demonstrar afeição por letras, fonemas e palavras monosilábicas me conferem o talento de aferir ditongo oral crescente em fila de banco e aguardar por fins esdruxulos por onde passo.
Por exemplo, por aqui.

Infantologia Sórdida em Dó Menor

Não sou doce pra me sentir tão amargo
façamos um trato
Deixo-me esfumaçar
e você me resolve com um trago!
Mas que saco essa peleja social
tentar parecer para o mundo
o que não é real
Jogar fora sorrisos sinceros
pra se fazer de marginal
Bancar o duro na queda
e se acabar no sonrisal
porque, afinal
ninguém tá interessado na verdade
isso a gente vê na TV
aqui, fora, joga-se conversa
chora-se solidão
reclama-se pela falta de tostão
e a principal preocupação
é de se sentir especial.
-x-
(de preferência através do reflexo
dos seus desejos mais íntimos
e carência mais infantil
na retina dos olhos
de quem você vai mandar
pra puta que o pariu
quando o próximo corpo sarado passar)

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Distante do Meio da Sala

Queria eu poder parir perdão
como a mãe natureza pare verão
em cada amanhecer

Viver é mais que uma caminhada
solitária nessa estrada
às vezes desviada por mal entender

Sonhar com o futuro é como
pagar multa e juro
por não ter menos o que temer

Por isso vejo estreito o muro
fronteira entre a terra
e o céu escuro, cobertor
dos artistas e de mim, escritor
equilibristas indecisos
incansáveis dançarinos
caem bem aonde for

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Conto Final


Olhou o relógio e conferiu as horas.
Pra sua surpresa elas indicavam os exatos instantes antes do momento certo. Cobre o pulso com a manga do paletó de corte impecável, pega a maleta repousada no chão ainda úmido da chuva de ontem e segue assim que o ponteiro grande insinua movimento.
Seus passos são calmos, passos de quem sabe o que quer e tem um bom motivo. Bons motivos são a chave para o sucesso. Espera o sinal fechar e atravessa a alameda, a essa hora já circula um sem número de vidas, atoladas, fugazes, felizes, incompletas, trabalhadoras, todas em comunhão sem saber, desfrutam coletivamente de um lindo dia de Sol, daqueles de cores vivas e cheiros, sobretudo de grama, provocados por uma generosa pancada de chuva durante a madrugada. Poucos se percebem. Poucos o percebem. Segue em frente, dobra a próxima esquina e avista seu destino por cima do ombro esquerdo da linda mulher que vem em sua direção.
Ela o fita inteiro e depois de voltar com seu olhar da linha da cintura, solta-lhe um sorriso que, em primeiro momento, parece flerte, mas ele já viu esse olhar antes, o sorriso é apenas um convite aleatório desses olhos belos e tristes, vítimas da solidão metropolitana, que apenas desejam brilhar novamente numa mesa de um café qualquer após marcar o próximo encontro com o outro par de olhos cansados da mesma solidão cotidiana de quem tem mais o que fazer. Ele aproveita a barreira de seus óculos escuros para não dizer que sim nem que não e segue com a mesma calma para o enorme prédio que ergue-se no fim da rua.
Em frente ao edifício ele confere mais uma vez seu relógio. Sorri ao notar que está exatamente 1 minuto adiantado. Tempo suficiente para comprar um buquê de rosas na barraca ao lado. O vendedor, um senhor de idade avançada, lhe dá junto com o troco um sorriso gasto, de quem a muito escolheu essa tarefa tão árdua quanto poética, a de vender flores na cidade, e que hoje se pergunta se ainda há amor suficiente nas ruas para pagar as suas contas. Com o buquê em mãos ele adentra o suntuoso hall do prédio.
É um edifício comercial dos mais antigos do bairro, talvez da cidade. Chão frio de um mármore acinzentado e com grandes colunas sustentando os mais de 20 andares, transmite bem o vazio das ações que são tomadas em seu interior ao longo de tantos anos. Ele pára no meio do saguão, olha a mesmice ao redor e sobe seu horizonte para a altura do grande relógio que marca a hora certa bem acima da fileira de elevadores ao fundo. Por traz da bancada a recepcionista parece que o encara com desconfiança a algum tempo, isso lhe faz lembrar que toda vez que havia entrado nesse prédio ele se pegava fazendo a mesma coisa, palmeando todo o lugar com olhos curiosos porém acostumado a ver sempre a mesmas coisas, que no fundo são uma só; nada. Mas ele resolveu que hoje mudaria essa mesmice. Saúda a desconfiada recepcionista com um sorriso generoso na tentativa de baixar a sua guarda, o que de fato acontece logo que tira seus óculos escuros do rosto revelando um belíssimo par de íris de um azul tão profundo quanto as revoltas águas do mar do norte. Ele entrega sua identidade e recebe em troca um radiante sorriso, dessa vez um sorriso de olhos simpáticos, supondo uma inocente felicidade juvenil (ela de fato não aparenta ter mais que vinte e poucos anos ou ter sofrido desilusões suficientes). Aparentemente sem pensar ele retira uma das rosas do buquê e presenteia aqueles que até o momento foram os olhares mais sinceros que havia recebido naquela manhã. Deixa a ruborecida face da moça para traz e se encaminha para o elevador que leva até o penúltimo andar, ou o último andar acessível ao público.
Ao seu lado aglomeram-se pessoas, trabalhadoras, arrumadas, importantes e com muito pouco tempo para outras pessoas. São mulheres e homens em forma de lubrificantes das engrenagens da cidade, do governo, do sistema, que venderam seus sonhos para a mídia e pagam diariamente suas dívidas com dinheiro e com o que lhes resta de amor. Mas os cheiros inebriam, principalmente o da morena ao seu lado. Ela não é tão bonita e jovem quanto a recepcionista, mas é tão impecável quanto as engrenagens de um relógio suíço. Instintivamente seu pescoço vira para observar a beleza daquela mulher ao mesmo tempo que o pescoço dela também obedece aos seus instintos se virando para saber de quem eram o par de olhos que a fitava. Foi quando a campainha dos elevadores soou desligando ambos daquele momento, automaticamente devolvendo-os aos seus objetivos que continuam mas em elevadores diferentes. A porta se fecha e a caixa metálica sobe com cerca de 15 pessoas dentro.
Mais uma vez ele levanta a manga e confere as horas. Nesse momento uma menininha lhe pergunta se seu relógio está certo. Ele levanta a cabeça e fita sua mãe, que morde o lábio e olha fixamente para o ascender e apagar do número dos andares. Ele estende o braço e convida a menina a conferir o relógio por ela mesma. De dentro de sua bolsinha ela retira um belo celular rosa que mostra em seu visor que o relógio do pulso está adiantado alguns minutos, ela prontamente o avisa com um expressão de preocupação. Ele agradece quando a porta do elevador se abre e a menina é levada pela mãe que bruscamente vai abrindo caminho entre os outros ocupantes do espaço. Mesmo com aquela velocidade ele ainda consegue responder o aceno da pequenina mão da menina antes da porta se fechar. Uma mulher reclama da violência da mãe com gestos grosseiros. Logo um pequeno grupo dos ocupantes concorda e adiciona novos tons dramáticos a pequena sessão de tribunal instaurada no elevador. Sessão que leva tempo suficiente para a porta se abrir duas paradas depois e o "juri" se espremer para saírem todos ao mesmo tempo. Por fim sobram ele e a operadora do elevador. Ela fita o buquê e sorri depois de assuntar sobre a falta de romantismo nos dias de hoje. Ele sorri de volta, a porta se abre, ele aponta para o relógio como quem sugere que está atrasado mas que também aponta o tempo como causador da falta de carinho em um mundo com cada vez mais pressa, tira uma rosa do buquê e presenteia a moça antes da porta se fechar.
Enfim lá está ele, novamente encarando aquele andar. As lembranças boas e ruins, que já não fazem mais sentido, arrancam um sorriso saudoso do seu rosto. Ele se permite fitar todo aquele aglomerado de cubículos, um após o outro, enclausurando as pessoas em suas tarefas eternas do dia a dia. Os falastrões no repouso do papo amistoso ao lado da máquina de café ou da copiadora. O barulho ininterrupto dos telefones lhe chega aos ouvidos como um despertador e o tira do pequeno transe, confere a hora e começa a se encaminhar para o fundo da sala. Mais uma vez seu buquê chama a atenção de alguns, mas ninguém comenta. Alguns poucos ali o conhecem, já trabalharam com ele, sabem seu nome mas não ousam chamá-lo, ao contrário, viram seus rostos de volta para a tela dos seus computadores, ou apenas se calam e observam ele andar em direção a sala dela. De frente pra placa que identifica a sala ele para e calmamente bate à porta. Lá de dentro vem a permissão. Entra, fecha a porta e deixa atras de si olhos incrédulos e curiosos, sepultados num silêncio até então ignorado por ele.
Dentro da sala ele se depara com uma grande janela, cobrindo todo o espaço da parede de fundo com vidro. A sua frente um grande encosto de cadeira virando-lhe as costas. De trás do encosto um braço fino se ergue no ar com o dedo indicador em riste, pedindo o segundo suficiente para encerrar a conversa ao telefone. Ele calmamente repousa a maleta no chão de carpete e se encaminha para a cadeira em frente a mesa dela. Em meio as tentativas de conclusão de assunto que ela fala por trás da cadeira que os separa, ele perde seus olhos pela mesa, lá encontra uma fotografia dela ao lado do relógio informando além da hora certa, que o tempo é curto. Num movimento brusco e repentino a cadeira se vira e eles se olham pela (e como se fosse) primeira vez. Os olhos âmbar dela pairam demoradamente na imensidão azul dos dele. Sua expressão de incredibilidade se acentua quando enxerga o vermelho vivo das rosas se aproximando através do gesto dele. Ela se recusa a tomar o buquê nas mãos e se levanta com a tez tensa, tentando refrear um pranto forte que invade o peito, vira-se de costas e caminha para se abrigar na imensa cidade aos seus pés do outro lado do vidro. Ele repousa com cuidado o buquê na mesa, propositalmente entre a foto dela e a foto de uma criança, depois de retirar mais uma rosa se encaminha na direção dela que, pressentindo o movimento pede pra que não o faça. Ele obedece. Enquanto ela desabafa, entre soluços cada vez mais altos, e lamenta o tormento que foram os últimos dias ao lado dele e os outros tantos longe, ele olha mais uma vez o relógio. A tristeza aumenta em seu coração quando ela lembra da pequena criança da foto. A culpa é grande, mas não mais maior que o amor que sente ao ver ela parada ali, como toda aquela força enfraquecida, com toda aquela luz ofuscada por sentimentos confusos, incertezas e inseguranças, pelo medo de estar só justo agora, pelo medo de não ter mais as mãos dele para segurar entre as dela e pior, sem ter a certeza de encontrar conforto nelas, conforto infalível desde sempre. Sem força para seguir em frente, ela diz não ver mais motivos para continuar. Confessa sentir-se incapaz de amar com um tom de voz baixo, de quem desistiu da vida a muito tempo e vive uma vida conformada e confortada nas banalidades da vida adulta. Nesse momento ele, com a rosa solitária na mão esquerda, a abraça forte por traz e coloca o botão vermelho na altura dos olhos dela, repousa seu queixo no seu ombro direito e força um sorriso a naufragar nas lágrimas que descem dos seus olhos. A dor é grande mas ele não se importa, e diz pra ela também não se importar, que a algo maior na vida, e esse algo é o amor, o amor que sempre sentiram um pelo outro, desde os tempos da escola quando matavam aula na gangorra da praça do bairro e ficavam doentes de febre quando o outro faltava a uma aula sequer. Não importa mais se a vida não faz sentido, na verdade nunca fez, com suas regras, sua mania de apenas favorecer aos já favorecidos, de fazer sofrer os que nada tem, sua irritante pontualidade, no imenso fracasso que são a maioria das relações entre as pessoas, ou no movimento de afastar os que se amam de verdade pelos sentimentos negativos da maioria. E só valeu a pena, ele diz soltando a rosa e pegando-lhe os ombros para virar-lhe de frente, só valeu a pena porque ela sempre esteve lá, desde o início, e que não poderia seguir mais um minuto adiante com a incerteza de perdê-la novamente, de não poder confortá-la, de não ser o seu amigo, amante, amor. Ela o fita nos olhos, ambos os pares mareados de lágrimas, e repousa sua face no peito dele que a abraça. Seus corpos terminam a conversa com silenciosas juras de amor eterno.
O silêncio da reconciliação é interrompido por um barulho agudo que vem de dentro da maleta repousada no meio da sala. Então ele sobe a manga do paletó e confere a hora pela última vez com um sorriso aliviado.
"Que horas são?" - ela pergunta
"Hora de amar para sempre!" - ele responde aninhando carinhosamente a cabeça dela em seu peito. Ela sorri.
No segundo seguinte a sala vai pelos ares levando todo o mundo junto com o amor dos dois para a eternidade...